quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Conheça a rotina da baiana que encantou milionário italiano

Enquanto não se encontra com o italiano, que pretende deixar sua fortuna para ela, Jucélia continua a tocar sua vida de gata borralheira em Itaberaba
No quintal de uma pequena casa, em uma estrutura erguida em alvenaria, mas sem reboco e com telhado de “eternit”, mora a Cinderela baiana. A artesã e líder comunitária Jucélia Lima da Silva, 35 anos, diz estar muito perto de se encontrar com Germano, o milionário italiano desenganado pelos médicos que prometeu deixar toda a sua fortuna para a itaberabense. Mas, por enquanto, ela ainda vive dias de gata borralheira.
O Repórter Alexandre Lyio do Jornal O CORREIO, foi a Itaberaba, na Chapada Diamantina, conhecer de perto o dia a dia da mulher que, durante uma viagem de avião à Europa, convenceu o empresário com câncer terminal a esquecer da ideia de cometer suicídio. Desempregada e sem casa própria, já que investiu tudo que tinha em uma ONG, Jucélia teve que improvisar uma morada nos fundos da casa da mãe. Mora  com o filho Rafael, 20 anos. Dorme todas as noites num colchão estendido em cima de um tapete de sisal.
Na outra casa, no mesmo terreno, vivem a mãe de Jucélia, um tio sobre uma cadeira de rodas  vítima de AVC e uma tia com problemas psicológicos. Tão difícil quanto sua vida é entender de onde ela tira o bom humor. Faz piada com tudo. Ri cada vez que respira. Ri, inclusive, dos próprios problemas. Quando se conhece Jucélia pessoalmente, entende-se perfeitamente por que um estrangeiro, empresário do ramo de exportações resolveu deixar tudo para ela.   
Conheça a História 
Ela mora numa casa simples
Jucélia ficou conhecida como a Cinderela de Itaberaba após o CORREIO publicar sua história. Ao embarcar em um avião para a Itália no dia 5 de junho do ano passado, sentou-se ao lado de um italiano, que se apresentou como Germano. Foi à Europa atrás de trabalho e dinheiro para a Fundação Beneficente Sonho de Mulher, ONG que criou em 2007.
O italiano parecia chorar  e Jucélia o interpelou. O homem, aparentando entre 60 e 65 anos, explicou que estava com os dias contados, sofria de câncer de próstata terminal e estava prestes a se matar. Com sua psicologia de itaberabense humilde, Jucélia deu novo sentido à vida do milionário.  
Como prova da viagem, além do passaporte, ela tem os tíquetes do voo TAP entre Recife e Milão, com conexão em Lisboa. No aeroporto da capital portuguesa, aliás, Germano a  ofereceu um colar de esmeraldas que ela observava na vitrine de uma joalheria. Ela recusou e o italiano se encantou de vez com a baiana. Os dois se perderam no desembarque e nunca mais se viram. O italiano contratou então o detetive Antonio Aguirrazer para encontrá-la.
Depois de muito pesquisar, Aguizarrer encontrou o fotógrafo Adson Chan, amigo pessoal de Jucélia. Ao CORREIO, o detetive confirmou que o objetivo de Germano é deixar para Jucélia toda sua herança.  
Doença
A expectativa para o encontro é enorme. A demora causa desconfiança na cidade. Exceto em Jucélia, que mantém contato com a Itália. “Germano está doente. Assim que ele se recuperar vem ao Brasil. Eles estão fazendo tudo com muita tranquilidade”, explica ela, que diz não saber o sobrenome do estrangeiro. 
Enquanto isso, Jucélia vai levando a vida de Gata Borralheira. Tudo piorou depois que a ONG foi assaltada, em 2007. Despreocupada com o dinheiro, afirma já ser rica. “Tenho pessoas como vocês ao meu lado. Tenho uma mãe que é meu tesouro e um filho lindo. Não tenho bens materiais, mas já sou uma milionária”.
Quem conhece Jucélia afirma que ela vive de ajudar as pessoas.“O objetivo dela não é ficar milionária, é realizar o sonho das mulheres. Você vê aí, ó. Ela não está nem aí para o dinheiro”, diz Rosilene Cardoso, 36 anos, uma das beneficiadas pela ONG. “A hora dela chegou”, faz coro Marlúcia Oliveira, 35 anos, que também faz parte do projeto.
Jucélia foi mãe solteira aos 16 anos e diz ter nada menos que 32 irmãos. Pelo visto, gente para ajudar não vai faltar. “Mas não sei nem o nome de alguns. Meu principal objetivo é ajudar a ONG”, diz Jucélia, que tem que aguentar o assédio de novos amigos.
“Apareceu um monte de gente dizendo que me conhece. Até uma prima nova eu já tenho. Mas tem espaço pra todo mundo”. Pelo visto, a cidade de Itaberaba, na Chapada Diamantina, está muito perto de se tornar o reino encantado de uma Cinderela com enorme coração.
Cidade vive expectativa de desfecho feliz
Devido aos trabalhos sociais que sempre desenvolveu, a cozinheira e artesã Jucélia Lima da Silva sempre foi uma pessoa conhecida em Itaberaba. Mas agora está difícil até mesmo sair pelas ruas. “Onde eu vou o pessoal me para fazendo perguntas. Tô evitando até sair”, diz.
As amigas da ONG são interpeladas por gente que nem conhecem. “O pessoal pergunta onde está o tal do Germano, pergunta se a história é verídica e quando ele vai aparecer”, conta Beatriz  Aragão, 26 anos, uma das integrantes da Sonho de Mulher.  
As rádios da cidade recebem ligações diárias. Alguns ouvintes questionam a veracidade da história e a demora na solução do caso gera ainda mais desconfiança e especulações. “As pessoas ligam para cá o dia inteiro. Muitas querem saber se se trata de uma farsa. Aí eu respondo que, se for uma farsa, Jucélia é a maior dramaturga do mundo. Porque criar uma história dessas não é para qualquer um, né?” diz André Rocha, da rádio Baiana AM de Itaberaba.
“Esse detetive poderia ser mais rápido, poderia agilizar isso aí”, reclama André. Na internet, o assédio sobre Jucélia é ainda maior. “Somente em um dia, recebi 76 convites de amizade no Orkut”, calcula ela. Pudera: Quem não quer ser amigo da Cinderela de Itaberaba?
ONG foi invadida em 2007
Fundada no dia 10 de janeiro de 2000, a Sonho de Mulher foi criada para oferecer cursos profissionalizantes de artesanato e costura para as itaberabenses. Mas, no final das contas, a ONG criada por Jucélia ajuda quem aparece, seja lá qual for o problema.
“Atendíamos até mulheres que eram vítimas de violência”, diz a fundadora do projeto, que fala no passado porque uma invasão ocorrida em março de 2007 reduziu muito a possibilidade de realizar os sonhos de mulheres carentes. Os ladrões levaram computadores, tecidos, máquinas de costura e todo o tipo de artesanato. “O que eles não levaram, destruíram”. Jucélia apresenta o Boletim de Ocorrência que comprova o arrombamento no dia 16 de março de 2007.
Antes do assalto, a ONG funcionava a pleno vapor. Chegou a receber o prêmio TOP 100 Artesanato entre as melhores instituições do Brasil em qualidade de produto. “Tá pensando o quê? A gente é chique, rapaz”, brincou Jucélia, exibindo uma colorida colcha de retalhos produzida pelas mulheres que ainda resistem na Fundação.
A ONG chegou a ter um cadastro com 480 famílias, todas vivendo da venda de artesanato. Mas, hoje, está praticamente parada. A sede teve de ser devolvida. “Sem sede, máquina de costura e material, as mulheres fazem o que podem. Trabalham em casa mesmo com o pouco de material que conseguem”.  

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