quarta-feira, 1 de maio de 2024

Ilhéus: um patrimônio que desaba

A Constituição brasileira afirma que o Poder Público, junto da comunidade, “deve promover e proteger o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação”.
O texto constitucional fica mais bonito quando, atentos, fazemos memória de museus em chamas, bibliotecas entregues às traças e prédios históricos devorados por cupins ou simplesmente colocados à venda pelo preço do terreno. O Brasil, com as suas diversas leis e as suas várias instâncias para operacionalizar tais leis, é uma vitrine do descaso para com o patrimônio histórico e cultural.
Indo direto ao ponto, o descaso dos gestores locais para com o patrimônio de Ilhéus é estarrecedor. O casarão que abrigou a Sociedade União Protetora dos Artistas e Operários de Ilhéos e desabou na terça-feira é o exemplo mais próximo. No segundo governo de Antônio Olímpio a Fundação Roberto Marinho fez tentativas para restaurar e administrar a União Protetora, mas não deu. Passaram os governos de Jabes Ribeiro, Nilton Lima e Mário Alexandre sem que nada fosse efetivamente feito para a sua desapropriação, apesar do nhém nhém de uma nota divulgada nada justifica o desapreço pelo sítio histórico. Até mesmo a ABI-Sul da Bahia tentou, com a Prefeitura através de convênio, instalar no local as representações profissionais e memórias da cidade. Não foi possível, porque mais do que empenho, faltou vontade política.
Entretanto, foi por vontade política e por determinação, nos governos do Prefeito Jabes Ribeiro -não lembro quais – foram reconstruídos o Teatro Municipal, a Casa de Jorge Amado, o Palácio Paranaguá e o Prédio General Osório, onde foram instaladas a Biblioteca Pública Adonias Filho e o Arquivo Público. O arquivo desapareceu, a Biblioteca sumiu e o prédio está prestes a desabar. Portanto, a desatenção não está atrelada somente às limitações orçamentárias e embaraços da legislação.
Outras unidades valiosas do sítio histórico de Ilhéus passam pelo mesmo descaso: O Casarão da Praça Coronel Pessoa; as casas do Sr Nagib, na Praça J.J. Seabra; O Palácio Episcopal, no Convento da Piedade; e a Igreja Senhora Santana, no distrito de Rio do Engenho e outros estão condenados ao mesmo fim.
É clara a atecnia do prefeito Mário Alexandre para com o patrimônio e a cultura. Porém, cabe a população, principalmente aos ilheuenses, estarem proativos em defesa da sua história, do seu patrimônio e da sua cultura.
Onde está o Museu do Cacau e o seu acervo? Para onde foi o Museu do Mar e da Mata? Aliás, e a Maramata o que fizeram dela? O que fizeram do terreiro de Oxossi (Pedro Farias) no Basílio? e o Museu Sacro da Igreja de São Jorge?
O patrimônio cultural nessa cidade está encaixotado, desapareceu ou desabou. Nem o Instituto Histórico e Geográfico que deveria estar atento, até denunciando e cobrando do Ministério Público estadual está calado.
Segundo o pesquisador Jan Assmann, da universidade de Konstanz, Alemanha, “à primeira vista, a memória parece uma coisa inerte, presa ao passado — a lembrança de algo que aconteceu e ficou parado no tempo. Mas um olhar mais cuidadoso revela que a memória é dinâmica e conecta as três dimensões temporais: ao ser evocada no presente, remete ao passado, mas sempre tendo em vista o futuro”.
Às vésperas de completar 500 anos, por não ter cuidado do seu passado, Ilhéus caminha celeremente para se tornar uma cidade sem futuro. Com a sua gente metamorfoseada numa massa amorfa sem consciência e habilidade sendo refém da percepção alheia. Sim! Qualquer povo que não preserva e procura conhecer sua história, não é dono do seu futuro.

30/04/2024 - Jonildo Glória
Jornalista e membro do Instituto Histórico e Geográfico de Ilhéus

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