domingo, 19 de agosto de 2018

Seminário aponta superlotação e loucura entre as principais causas de sofrimento de presos no Brasil


Presídios superlotados e hospitais de custódia onde os detentos com problemas mentais chegam a passar meses sem receber seus remédios. Dados apresentados durante o seminário ‘Direitos Humanos em Pauta: Sofrimento no cárcere’ indicam que essas são algumas das maiores causas de sofrimento dos presos brasileiros. Realizado na manhã de hoje, dia 17, na sede do Ministério Público estadual, no CAB, o evento foi promovido pelo Centro de Apoio aos Direitos Humanos (Caodh) com apoio do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional, Ceaf. Na abertura, a coordenadora em exercício do Caodh, a promotora de Justiça Nadja Brito Bastos, lembrou que os presos têm direitos humanos incontestáveis e é dever do Sistema de Justiça garantir esses direitos. “O encarcerado não pode ser tratado como um ser invisível. A dignidade do preso precisa integrar a política de segurança pública”, afirmou.
O número de presos no Brasil passou de 200 mil, em 2004, para 800 mil em 2018, afirmou o coordenador da Unidade de Monitoramento da Execução de Penas (Umep) do MP, promotor de Justiça Edmundo Reis. De acordo com ele, dados do Ministério da Defesa revelam que 85% desses presos não estão em nenhum programa de ressocialização. “Como ressocializar, segregando?”, provocou o promotor, afirmando que a Lei de Execuções Penais brasileira tem um caráter humanitário, mas não é cumprida em sua integridade. Edmundo Reis afirmou que “o encarceramento precariza a segurança, a saúde e a assistência psicológica dos presos”. Para ele, uma alternativa mais econômica que criar vagas, seria investir na ressocialização. “Abrir uma nova vaga no sistema prisional custa R$40 mil e cada preso custa mais R$3.500,00 por mês. Se 70% desses encarcerados trabalhasse e estudasse, reduzindo sua pena, como prevê a lei, em 12 anos a economia seria de R$1,3 bilhões”, frisou.
Na Bahia existem 14.500 presos ocupando 12 mil vagas, afirmou o defensor público Daniel Nicory do Prado. O número não leva em conta os presos provisórios que estão nas delegacias. “Acrescentando esse número, estimado em cerca de 3 mil, a superlotação passa das 5 mil pessoas”, afirmou Daniel, para quem a superlotação é “a maior causa de sofrimento no carcere”. “Por conta da superlotação, direitos elementares e até mesmo necessidades básicas, como a alimentação e o sono, são limitados para os detentos”. O defensor público falou ainda sobre as soluções adotadas em países como os Estados Unidos. Com o maior contingente prisional do mundo, o País adotou um limite de 37,5% para o excedente de prisioneiros. “O que passa desse limite, viola a dignidade da pessoa humana, segundo levantamentos do Departamento de Polícia do Estado da Califórnia”, afirmou, acrescentando que, quando esse limite é atingido, a lei norte americana obriga o Estado a “soltar presos ou criar novas vagas”.
Ao traçar um perfil do uso de psicotrópicos prescritos no sistema prisional, a promotora de Justiça do Ministério Público de Pernambuco, Irene Cardoso Souza, disse que os loucos infratores, sobretudo as mulheres, estão entre “as maiores vítimas” do sistema carcerário. “Enquanto 10 % dos presos do sexo masculino precisam de psicotrópicos, entre as presas esse percentual passa dos 40% em Pernambuco”, explicou. Ele disse que a maior parte desses detentos ocupa os hospitais de custódia. “Os problemas que eles enfrentam não são sequer imaginados por quem está do lado de fora”, afirmou a promotora que coordena o grupo de trabalho que trata de Racismo no Grupo de Atuação em Execução Penal (Gaep). Como exemplo, ela relatou um problema de licitação no Estado de Pernambuco que deixou os hospitais de custódia sem medicamento por mais de três meses. “Houve diversos surtos, sobretudo entre as mulheres: um sofrimento que não conseguimos imaginar”, destacou. O evento foi encerrado com o lançamento do livro “A Terceira Pessoa Depois de Ninguém”, da professora Emanuela Carvalho, que fala da experiência de vida das mulheres no cárcere.

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