segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Carrapatos: negligência velada na Saúde Pública

Tatiani V.Harvey 
Médica Veterinária 
Doutora em Parasitologia/UESC

CRMV/BA 04034
@tatiani_harvey

Com o verão ilheense chegam as férias, os passeios, as trilhas, o veraneio na roça e, inevitavelmente, o aumento à exposição ao segundo maior grupo de vetores de zoonoses, os carrapatos. 

As doenças transmitidas por estes artrópodes, especificamente através da picada, podem ser causadas por bactérias, vírus e protozoários, resultando, em homens e animais, manifestações clínicas importantes como febre, dor muscular, paralisia, erupções cutâneas, dermatite, alergia e toxicose. Estes sintomas, por serem compatíveis com outros tipos de afecções, muitas vezes não levam os médicos a suspeitarem, ou, ao menos, cogitarem, estas infecções. Entre estas doenças, temos a febre maculosa, a erliquiose monocítica humana, a doença de Lyme, a babesiose e a anaplasmose, além de algumas arboviroses. 
No Brasil, a doença de maior relevância é a Febre Maculosa Brasileira, uma forma mais branda da infecção febril aguda, mas com nível de gravidade variável. Já a babesiose, a anaplasmose e a erliquiose, estão mais sujeitas ao diagnóstico veterinário, pois a ocorrência, a distribuição e a descrição de casos humanos deve, ainda, ser estudada profundamente no país. Especialmente, em localidades como a nossa, em plena Mata Atlântica, onde vários fatores ambientais e antrópicos facilitam a disseminação destes vetores. E a Doença de Lyme, ou Borreliose brasileira, continua negligenciada tanto por médicos, como veterinários. 
Na verdade, os carrapatos ainda não assumiram a posição adequada no contexto da Saúde Pública Humana. Fato que se confirma através da Lista Nacional de Notificação Compulsória, Lei no 1.271/2014, onde a única doença transmitida por carrapatos citada é a Febre Maculosa. Um absurdo, num país de perfil tropical como o nosso. Isso sem falar em suspeitas negligenciadas e nos possíveis casos não notificados.
No entanto, já se observa melhora nas informações do Ministério da Saúde, apesar do atraso na atualização do banco de dados, que é extremamente importante para a vigilância e controle de doenças. Segundo os últimos dados do DATASUS, em 2017, tivemos 183 casos de Febre Maculosa no Brasil, distribuídos entre CE, ES, GO, PR, RO, RJ, RS, MG, SP, SC, sendo que os três últimos estados concentram a maioria dos casos. Um aumento estrondoso de notificações, ao comparar o período entre 2013 e 2016! Aumento real do número de casos ou evolução no diagnóstico? Provavelmente, incremento diagnóstico. 
Fazendo uma analogia com a situação da saúde e da pesquisa no Brasil, você pode observar e visualizar que ainda há muito a fazer em Saúde Pública neste país. Os discursos e propagandas têm sido muito caros e bonitos, mas a atenção e os recursos se esvaem sem atender as reais prioridades. Num país como o nosso, carrapato é prioridade! Ainda não foi oficialmente registrado o caso de Febra Maculosa numa baiana picada durante uma visita a duas localidades de Ilhéus e a uma localidade de Una, em dezembro de 2018. Você sabia que a Febre maculosa já chegou na região sul da Bahia? 
Bem, diante desta realidade, médicos e veterinários devem ficar atentos aos sinais e sintomas suspeitos nos indivíduos que frequentam ou vivem em comunidades rurais e periféricas, e às doenças infecciosas resultantes de atividades ecoturísticas ou em áreas similares aos locais onde casos humanos têm sido relatados, no Brasil. 

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