sábado, 25 de julho de 2020

Saúde: um efeito colateral das redes sociais

Dra Tatiani V Harvey
Médica Veterinária
Mestre e Doutora  em
 Ciência Animal Ênfase
em Doenças Parasitárias
 
É inegável o ganho social proporcionado pelas redes sociais, tanto a nível individual quanto coletivo e tanto físico quanto jurídico. E é fato que elas estenderam o limite da informação abreviando as vias de comunicação, o que foi um ganho imensurável para toda sociedade. Porém, como qualquer medicamento, elas trouxeram consigo uma gama de efeitos colaterais. E, como uma faca dois gumes, o mais novo palco da vida e o consequente deslumbramento pelo fim do anonimato podem constituir-se num novo problema de saúde pública. 
Outro dia abri uma conta numa rede extremamente popular voltada para a veiculação de vídeos, no intuito de divulgar informações sobre a prevenção de zoonoses e doenças em animais. Foi a primeira vez que me dediquei a desvendar o conteúdo que trafega, normalmente, nesta via. E algo me chamou muito a atenção: há muitas pessoas aproximando-se e acolhendo animais silvestres em suas residências, e fazendo da história destes animais em suas vidas a fonte de sua popularidade. Isto é extremamente preocupante! Não apenas pela aproximação inconsequente a estes animais, mas pelo comportamento arriscado destas pessoas ao manejá-los. 
Apesar da maioria dos vídeos serem de origem estrangeira, o estímulo a este tipo de atitude é imenso para todos aqueles que os assistem. Há vídeos de raposas, gambás, veados, lobos, outros pequenos mamíferos, aves silvestres...enfim, uma diversidade enorme de animais, que são abraçados, beijados, acariciados, acessam camas, sofás...todo o ambiente familiar. Há vídeos que mostram pessoas alimentando animais silvestres que se aproximam de suas residências para iniciar uma aproximação. Há vídeos de resgates sem equipamento de proteção ou sem noção nenhuma de como preceder em determinadas emergências. Tudo pela promoção, infelizmente. 
Um outro fato que me chamou a atenção foi o comentário de um colega influenciador que relatou que muitos dos seus seguidores não gostam de ouvir veterinários falando em doenças que possam ser transmitidas por animais. Fato que eu posso testemunhar ao receber uma mensagem de alguém dizendo: “Boa sorte com este tipo de informação! ” 
Obviamente, o efeito colateral que me refiro é a potencialização da transmissão de doenças e outros agravos à saúde humana, à saúde de nossos pets e de outros animais domésticos que pode resultar deste tipo de comportamento. A inconsequência destas ações pode vir a tornar-se, sim, um problema para a saúde coletiva ao introduzirmos em nossas comunidades animais que não passaram ou nunca passarão por uma avaliação clínica adequada. 
Ao meu ver, em tempos de censura nas redes, discussões sobre fake news, fobias, discriminação, todos os conteúdos que estimulam comportamentos de risco à saúde deveriam ser, da mesma forma, alvejados. 
Fica aqui, também, um alerta para os órgãos reguladores da criação de animais silvestres. Afinal, a Naja só foi descoberta porque o tutor foi picado.

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