Esta coluna tem sido usada para refletir temas variados, inclusive para abordar questões de ordem social e religiosa, especialmente nos campos da liturgia católica e dos problemas que assolam a população brasileira, na busca de relacionar a fé professada e a vida em seu quotidiano.
Pe. Damião Conceição de Souza Borges
Como em momentos precedentes, destaca-se aqui, nestas linhas, a grande tônica da Páscoa, que dura mais precisamente cinquenta dias e em sua constituição ritual e simbólica, faz memória da ressurreição de Jesus e traz aos cristãos de todos os tempos, mas singularmente deste tempo atual, marcado por tantas desgraças, um sinal de esperança que o bem vence, que as trevas vencem; a vida sempre vencerá morte.
As celebrações litúrgicas no tempo pascal são pujantes em fortalecimento da esperança. Essa expressão que tem sido lembrada mundo afora, sendo “invocada” como uma maneira de manter viva a chama de vida nas pessoas. Por sua vez, a Páscoa é eminentemente uma esperança, que suscita alegria e reconforto.
Não obstante, a Páscoa que emana frutos de vida e esperança, está acontecendo em um contexto pandêmico e desafiador. Face a isso, indaga-se: qual o sinal de vida que a Páscoa traz para além da ressurreição do Senhor, ou seja, qual o sinal concreto de ressurreição que a Páscoa apresenta neste tempo, que seja visível aos olhos dos crentes?
Uma das novidades mais significativas desse tempo de Páscoa são as diferentes fotografias e imagens que são postadas, de pessoas queridas, conhecidas e anônimas, que emocionalmente foram para a fila da vacina e receberam-na, como uma verdadeira expressão de Páscoa, de esperança, de vida.
O tema vacina é sem sombra de dúvida, um grande sinal de Páscoa, uma vez que esse evento é a plena manifestação da Vida que vence a morte, de maneira plena (cf. 1 Cor 15, 55-56) e a vacina são gotas de esperança lançadas no coração humano. A vacina é um grande sinal de ressureição, de vida, de vitória e deve ser acolhida e defendida por todos, obrigatoriamente pelos cristãos, que são adoradores de Jesus, que por sua vez é vida em si mesmo (cf. Jo 14, 6).
Porém, simploriamente, pode-se indagar sobre a disparidade entre vacina e crença, ciência e religião, Páscoa e intervenções médicas. Em princípio, para uma avaliação da interlocução entre esses dois polos, é mister salientar que são realidade que não se opõem, mas se entrelaçam, haja vista que são duas vertentes que se envolvem com o cuidado com o ser humano, artífice da dinâmica existencial.
Outrossim, a ciência é uma grande benção para a humanidade, porque é fruto da inteligência do ser humano e essa é querer do próprio Deus, que criou a pessoa humana com capacidades ímpares (cf. Gn 1,27-29). Neste sentido, nota-se uma intervenção do próprio Deus, neste momento pandêmico, que através de dons concedidos a homens e mulheres de todas as épocas, para que com o trabalho científico, colaborem eficazmente com o bem-estar de todos, os tem dado condições de continuar laborando em favor do semelhante.
Por esta vertente, compreendendo que a Páscoa é a celebração do renascimento, a aplicação da vacina é, com certeza, um grande símbolo de ressurreição. No entanto, da mesma forma que o pecado da humanidade “aprisiona a plena eficácia na ressurreição do Corpo Místico de Cristo”, que é a Igreja, o sinal de ressurreição, que é a vacina, continua aprisionada, seja pela dificuldade de acesso na produção, devido à grande demanda mundial, seja pela morosidade de quem tem obrigações moral e jurídica de prover esse medicamento e dar acesso à população.
Deste modo, a população brasileira caminha entre luzes e trevas, alegrias e lágrimas, esperanças e dissabores. E neste emaranhado de sentimentos, a vida precisa prosseguir, as responsabilidades devem ser assumidas por quem de direito e as realidades, ainda que sejam exigentes, são questões que precisam ser enfrentadas com resignação.
Por fim, que a Páscoa seja vivida com vibração e regozijo e que a vacina oportunize o reacender das esperanças e que ela chegue a todos, nos lugares mais recônditos e às pessoas mais “esquecidas” Brasil afora. Viva ao Ressuscitado, viva a vacina, viva a vida!
Que o Ressuscitado nos ajude!!
2 Presbítero da Diocese de Ilhéus. Licenciado em Filosofia pela FBB, Bacharel pela UCSAL, chanceler da Cúria diocesana de Ilhéus e mestrando em Direito Canônico pelo Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico do Rio de Janeiro, agregado à Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.
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