Dilexi te: “Eu te amei”, é uma bússola. Os pobres na 1a. exortação apostólica de Leão XIV

Cibele Battistini - Dilexi te representa para muitos uma esperança de que a Igreja católica, sob Leão XIV, não abandone os pobres, mas reafirme com clareza a preferência pelos que sofrem. O desafio será tornar essas palavras realidade no cotidiano: nas dioceses, nas paróquias, nas políticas, nos programas de caridade e serviço, nas decisões institucionais.
Em 4 de outubro de 2025, festa de São Francisco de Assis, Papa Leão XIV assinou sua primeira Exortação Apostólica, intitulada Dilexi te (“Eu te amei”). Trata-se de um documento magisterial centrado no amor pelos pobres, com destaque para justiça, compaixão e a necessidade de uma Igreja que viva não como instituição distante, mas como presença que caminha junto com os mais vulneráveis.
O título, Dilexi te, ecoa intencionalmente Dilexit nos, a encíclica de Papa Francisco, publicada em outubro de 2024, sobre o amor humano e divino do Coração de Jesus Cristo. Essa escolha já anuncia um traço de continuidade: a herança espiritual e pastoral deixada pelo pontífice anterior.
No comunicado oficial, nota-se que entre os temas abordados estarão as guerras e a emergência climática, vistas como grandes causadoras de pobreza e injustiça social; o apelo será para que os pobres sejam protagonistas na vida da Igreja, não apenas destinatários de ajuda.
Papa Leão e Papa Francisco: práticas, episódios e legado
Para entender melhor a exortação de Leão XIV — seu alcance e desafio — é útil olhar para como Papa Francisco viveu e pregou esse amor pelos pobres ao longo dos seus doze anos de pontificado (2013‑2025), e como muitos dos gestos de Francisco parecem estar sendo retomados ou reconhecidos como parte de um caminho que agora Leão segue.
A seguir alguns episódios que ilustram esse estilo pontifício:
1Lampedusa, 2013
O primeiro deslocamento pastoral de Francisco fora de Roma foi para Lampedusa, ilha italiana símbolo dos dramas migratórios no Mediterrâneo. Lá, denunciou a “globalização da indiferença” diante das mortes de migrantes no mar.
2Lesbos, 2016 (e em 2021)
Visitas às ilhas gregas, com campos de refugiados, e o gesto simbólico de levar refugiados no avião papal para Roma. A compaixão concreta frente ao deslocamento, à dor daqueles que fogem de guerras e pobreza.
3Instituição do Dia Mundial dos Pobres
Em 2016, por meio da carta apostólica Misericordia et Misera, Francisco instituiu o Dia Mundial dos Pobres, convocando toda a Igreja a solidarizar-se concretamente com os que mais sofrem.
4Confronto com as causas estruturais da pobreza
Francisco não se limitou a caridade individual, mas apontou as causas: guerras, desigualdades econômicas, crise climática, indiferença social. Ele exortava a “opção preferencial pelos pobres”, uma expressão teológica que se concretizava também em políticas, discursos, visitas e pronunciamentos
O que está em jogo
Com Dilexi te, Leão XIV retoma explicitamente essa tradição iniciada ou aprofundada por Francisco. Vejamos como ele enfatiza continuidade, e onde talvez já se vislumbre uma nota própria:
Continuidade: O tema central do amor aos pobres: Leão coloca os pobres no coração do primeiro documento de seu pontificado e utiliza símbolos e datas significativas. Além disso o documento foi assinado em 4 de outubro, festa de São Francisco de Assis, símbolo de pobreza, simplicidade, fraternidade
Espera-se que Dilexi te enfatize ainda mais a protagonismo dos pobres: não apenas serem objetos de assistência, mas sujeitos de direitos, de voz dentro da Igreja.
Também há indicação de maior reflexão ou urgência sobre as causas globais que agravam a pobreza: guerras, catástrofes climáticas, injustiças econômicas.
Pode haver uma intensificação da chamada à Igreja e à sociedade para não só mitigar sintomas, mas transformar estruturas. Esse será um traço que dependerá de como Dilexi te será levado à prática.
Narrativa: caminhar juntos no amor
Para ver esse momento de transição, imagine uma grande estrada trilhada por Papa Francisco durante doze anos, onde cada parada — Lampedusa, Lesbos, encontros com pobres, discursos, simples gestos de austeridade — deixou marcos luminosos que mostraram um caminho de retorno ao Evangelho “dos extremos”: com e pelos pobres.
Papa Leão XIV agora assume o leme dessa estrada. Dilexi te é sua bússola inicial: diz “eu te amei” não como um esquema retórico, mas como um compromisso. É lembrar que o amor divino precede toda ação, que cada pobre é amado e chama resposta. Mas também é convocar a ação: justiça, partilha, conversão, escuta.
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