Ao celebrarmos mais uma vez este ano a festa da proclamação bizantina e ao inaugurarmos um novo ano da graça do Senhor, dirigimo-nos à plenitude abençoada da Igreja Ortodoxa e de todo o mundo, convidando todas as pessoas a uma continuada vigilância, a uma consciência e mobilização de seus recursos, a fim de retornar ao estado que reflita - se não a condição absoluta eucarística e doxológica de Adão e Eva - pelo menos a condição inspirada pela graça e misericórdia de Deus.
Publicamos aqui a Encíclica Patriarcal para o Novo Ano Eclesiástico, escrita pelo arcebispo de Constantinopla, Nova Roma e Patriarca Ecumênico Bartolomeu.
+ BARTOLOMEU -
Pela misericórdia de Deus
Arcebispo de Constantinopla, Nova Roma e Patriarca Ecumênico
Para toda a Igreja, a Graça e a Paz do Criador,
Sustentador e Governador de toda a Criação, nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo
Abençoados irmãos, irmãs e filhos no Senhor.
A mãe comum de todos os ortodoxos, a Igreja de Cristo, o Corpo de nosso Senhor eterno e divino-humano Jesus Cristo, serve compassivamente através de todas as suas atividades, mas sobretudo através da Divina Eucaristia, oferecendo seus dons sagrados ao seu Criador no mistério da salvação. Ela faz isso com amor ilimitado, indiscriminado e comprovado a todos os seus membros no mesmo grau também demonstrado pelo nosso Pai celestial.
Em sua memória orante, a Igreja sempre tem em mente a presença de seus filhos, mantendo um vivo interesse e preocupação com tudo o que se relaciona e influencia suas vidas. É por isso que ela não permanece impassível ou indiferente com a destruição contínua e diária do ambiente natural, resultante da ganância humana e lucros inúteis, que por sua vez implica num desvio essencial da face do Senhor e resulta em uma consequente turbulência na natureza e em uma fratura da sua coroa, ou seja, da existência humana, cuja própria sobrevivência está ameaçada.
O Patriarcado Ecumênico de Constantinopla, por muitos anos, tem avaliado os sinais do nosso tempo, bem como a obrigação eucarística da Igreja Ortodoxa. Assim, declaramos e dedicamos o início do ano eclesiástico, ou seja, 1º de setembro, como um dia de oração e súplica pela preservação da criação de Deus, que foi herdada por nós como nosso meio ambiente. Neste dia, nós curvamos nosso coração e nossa alma, invocando a Palavra de Deus para olhar para a sua criação com bondade, para que Ele possa ignorar nosso pecado e ganância, "abrindo a sua mão para saciar toda a criação de bens" e pôr fim ao caminho destrutivo do mundo.
Claro, é verdade que um progresso significativo foi alcançado nas últimas décadas em relação à proteção do meio ambiente, especialmente através de uma constante sensibilização da consciência pública, utilização de medidas de precaução e restrição, criação de programas sustentáveis, retorno ao uso de fontes de energia mais moderadas, bem como muitas outras atividades proveitosas e notáveis. O esforço e a preocupação da Igreja Matriz de Constantinopla tem contribuído para essa situação, em cooperação com instituições internacionais e organizações ecológicas. No entanto, tudo isso é insuficiente.
Ao celebrarmos mais uma vez este ano a festa da proclamação bizantina e ao inaugurarmos um novo ano da graça do Senhor, dirigimo-nos à plenitude abençoada da Igreja Ortodoxa e de todo o mundo, convidando todas as pessoas a uma continuada vigilância, a uma consciência e mobilização de seus recursos, a fim de retornar ao estado que reflita - se não a condição absoluta eucarística e doxológica de Adão e Eva - pelo menos a condição inspirada pela graça e misericórdia de Deus.
A exploração ilimitada e insaciável dos recursos naturais da criação, que constitui a principal causa da destruição do meio ambiente natural, é - de acordo com o testemunho da teologia, da ciência e das artes - o resultado da queda do homem, isto é, da nossa desobediência ao mandamento do Senhor e da não conformação com a vontade de Deus.
No entanto, a Igreja oferece o antídoto para a resolução de nossa crise ecológica, convidando a todos para a restauração da imagem divina à sua beleza antiga e original. A reabilitação da natureza caída do homem por meio do sopro do Espírito Santo e pela participação dos seus dons também restaura uma relação equilibrada entre a humanidade e a criação, que foi feita por Deus para nossa alegria e prazer, mas também para oferecer-nos a Ele como o seu Criador.
A Igreja Matriz nos chama a "cultivar toda a criação na Palavra divina e no Espírito que dá vida", assim como São Simeão, o Estilita, a quem celebramos hoje, para que possamos ascender "do natural para o sobrenatural" e nos comprometer "com as visões místicas simples e absolutas da teologia", a fim de sermos elevados da criação ao Criador. É a habitação do Espírito Santo que diviniza a humanidade e, ao mesmo tempo, une-a com o ambiente natural, a fim de que possamos percebê-lo como parte de nós mesmos e respeitá-lo como algo sagrado sem sermos levados a abusos e extremos.
O nutrir da humanidade pelo mundo natural não pode ocorrer por meio de abusos gananciosos, mas pelo uso respeitoso, ou seja, pelo respeito mútuo entre os seres humanos e todos os seres criados, assim como com tudo o que tem vida e oferece a vida, que foi criado como "muito bom" pela palavra de Deus, ou seja, com todos os elementos da criação visível e invisível. Assim, seremos capazes de beber água da pedra fonte de vida, para contemplar o sol criado e conceber o sol espiritual da justiça, de olhar para a coluna material de São Simeão e ver a verdadeira coluna de luz, de testemunhar as nuvens de chuva e entrar na nuvem do Espírito Santo, a fim de que possamos descansar lá, onde Cristo entrou como nosso precursor, e ter nossos nomes gravados junto ao primogênito na Igreja celeste.
É somente quando continuamos com essa mentalidade - respeitando a contribuição de todos os seres vivos e vegetais na liturgia universal da vida - que podemos resolver todos os nossos desafios ambientais com o poder da graça divina e não por meio da débil violência humana. Essa mensagem de vida é uma mensagem da nossa responsabilidade para continuar a nossa luta espiritual e esforço com oração, exortação, encorajamento e apelo, atraindo a atenção de todas as pessoas no que diz respeito à necessidade de nos proteger da ira iminente, resultante de nossa alienação da natureza. O foco constante da humanidade nas coisas terrenas e corruptíveis provoca os problemas ecológicos na medida em que, quanto mais nos voltamos para a terra e este mundo, mais estamos nos alienando do céu e de Deus.
A Mãe e Grande Santa Igreja de Cristo assume e cultiva, sem cessar, essa responsabilidade obrigatória e salvífica da proteção do meio ambiente para a continuação espiritual e material da vida em nosso planeta. Portanto, nesse sentido, está organizando uma conferência ambiental no próximo mês de junho com o tema "Teologia, Ecologia e o Verbo: uma conversa sobre o meio ambiente, a literatura e as artes". O objetivo dessa conferência é despertar a consciência global para a importância particular e específica da dimensão ética e espiritual da crise ecológica - com especial referência para as artes e a literatura - a fim de que a criação possa ser devolvida à sua "beleza original", que é o propósito natural, integral e sagrado para a qual foi formada pelas mãos criativas da Palavra divina.
Tendo "dentro de nós a memória inviolável do julgamento do Senhor", nós damos testemunho desde o Centro Sagrado de toda a Ortodoxia da verdade da palavra e chamamos a atenção de todos para os perigos que estão diante de nós, que a graça de Deus certamente nos fará evitar em sua amorosa providência. E convidamos a todos a trabalhar pela preservação e pelo retorno de nosso mundo para a Fonte da Vida, pela intercessão da toda santa e sempre abençoada Theotokos, de São Simeão Estilita e de todos os Santos. Amén.
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