terça-feira, 27 de outubro de 2020

A insanidade em um gesto

Diante de tantas situações mundiais que desafiam a auto-compreensão humana, os homens e a mulheres de todos os cantos, crenças, níveis sociais, etnias e culturas são surpreendidos todo o tempo com notícias que levam a questionamentos muitos sérios sobre a capacidade de raciocínio humano e o mau uso de algo que é uma das mais sublimes capacidades que ele tem, que é a liberdade.
Pe. Damião Conceição de Souza Borges *
Em nome dessa liberdade, usada equivocadamente, pessoas de todas as qualidades sociais vão assumindo posturas que levam a refletir os que minimamente buscam, de maneira equilibrada, construir verdadeiros espaços de enfrentamento de problemas que mexem com o equilíbrio humano. 
No momento atual da história, muitas supostas ideias, como em outros momentos da humanidade, vem tentando impor suas supostas “filosofias” ou ideologias, que em si mesmas são um desserviço ao real aperfeiçoamento do ser humano que, com ideias reducionistas, restringem o ser humano a uma ótica de “cabresto”. 
Semana passada, o mundo foi surpreendido pela imagem desconcertante de um grupo extremista que, no afã de satisfação e imposição de uma bandeira ditas “minoritárias”, supostamente libertadora, ateou fogo em um templo católico no Chile de grande relevância histórica, religiosa, arquitetônica e cultural, como uma forma de demonstrar poder e impor uma ideologia de um suposto enfrentamento!
Como se não bastasse a atrocidade bem maquinada, as reações de satisfação pelo desabamento da torre do majestoso templo mostraram o contentamento insano dos autores e colaboradores passivos da dita ação. Mas, o que pode significar a euforia daquelas pessoas quando a torre do templo caiu? O fracasso da Igreja católica? A queda do poder? A destruição do Evangelho? A vitória de uma guerra unilateral? A destruição do nome de Deus? O que mesmo aqueles gritos significavam?
Pessoas que acreditam que destruindo templos católicos estão destruindo o catolicismo, estão completamente enganadas e desprovidas de elementos históricos que são inerentes ao ser da Igreja católica. Ela já nasceu perseguida e isso o próprio Evangelho atesta (cf. Mt 2, 1-12), ela foi rejeitada desde sua gênesis (cf. At 8,1-8) e continuará sempre perseguida, pois não comunga com as coisas deste mundo (cf. Jo 15,15-20). 
Mas, face a comportamentos tão vis, pergunta-se: ó, Igreja católica, o que fizeste tu para seres tão perseguida? O que tens que incomoda tanto as pessoas que querem viver “livremente”? Por que tua palavra incomoda tanto? Por que você não fica quieta e vive em paz com todos? Qual a tua motivação para que tua palavra incomode tanto?
A Igreja, que é o novo povo de Deus, como bem a definiu o então cardeal Joseph Ratzinger, foi constituída pelo seu Senhor, Cristo Jesus, para ser guardiã de uma Verdade, capaz de mudar a vida das pessoas, sedentas de profundidade. No entanto, o próprio Jesus alertou o “pequenino” rebanho incipiente que ele, independente do seu número, nunca viveria totalmente em paz, pois ela não existe para alinhar-se ao mundo (cf. Jo 15,19).
Deste modo, as ideologias da falsa liberdade, dos super-poderes, da liberalidade do sexo, que descaracteriza a pessoa humana como “templo sagrado”, das drogas como elemento destruidor, da sexualidade livre, que abre caminhos para a manipulação do ser humano, especialmente os adolescentes e jovens, de uma política comercial de exploração, ganância e subjugação dos mais fracos. As ideologias que defendem uma política selvagem, que valora o lucro sobre o bem-estar do ser humano. A isso a Igreja se opõe!
Essas ideologias, que transformam o ser humano em robôs de falsas ideias, em meros objetos, incapazes de pensar de forma mais aberta, nunca poderão ser aceitas pela Igreja católica e, ainda mais, sempre serão denunciadas como um mau, pois estão em desacordo com a verdade e com Aquele que é a verdade em si mesmo (cf. Jo 14, 6). Pelo mesmo viés, ainda que custe a redução dos membros da Igreja, a verdade deve ser dita, uma vez que, como contundentemente afirmou o São João Paulo II, “devemos defender a verdade a todo custo, mesmo que voltemos a ser somente doze”.
Mas, e os cristãos, perseguidos mundo afora, o que dizer para eles e para toda a Igreja? Não tem outra palavra, senão a do próprio Jesus: “ no mundo tereis tribulações, mas tende coragem, eu venci o mundo” (cf. Jo 16,33). Por isso, os católicos devem olhar para seu Senhor, numa perspectiva perseverante, numa postura firme, como bem orienta o autor da carta aos Hebreus: “conservemos os olhos fixos em Jesus, o autor e consumador da nova fé” (Hb 12,2). São Paulo: eis a vitória que vence o mundo é a nossa fé (cf. 1 Jo, 5,4). 

1 Presbítero da Diocese de Ilhéus. Licenciado em Filosofia pela FBB, Bacharel pela UCSAL, chanceler da Cúria diocesana de Ilhéus e mestrando em Direito Canônico pelo Pontifício Instituto Superior de Direito Canônico do Rio de Janeiro, agregado à Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. 


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